Alguns livros foram escritos para ouvir. Não me refiro a audiobooks. Ou a livros que viraram filmes e as músicas adicionadas à trilha sonora como a Lana del Rey em O Grande Gatsby e Paramore em Crepúsculo.
Falo sobre livros em que a música é um dos personagens principais, movimentando os acontecimentos e marcando momentos importantes. Sem mais delongas, aqui vai uma singela listinha de 5 livros nessa pegada e todas as músicas que pude catalogar e reunir em playlists do Spotify.
Trainspotting (1993) de Irvine Welsh
Trainspotting é um dos meus filmes favoritos desde a primeira vez que o vi, mesmo não entendendo nada. Hoje, eu compreendo a história em termos de relatar os acontecimentos, mas o que é narrado ali é algo tão distante da minha realidade, que talvez a minha compreensão jamais seja completa. O livro escrito pelo escocês Irvine Welsh conta a história de um grupo de jovens e sua vida no subúrbio. Entre todas as incómodas, perigosas e traumáticas aventuras que essa galera poderia viver, a música é um personagem importante. Durante todo o livro, Welsh cita diversas canções que embalaram os agitos da juventude escocesa nos anos 90.
Tanto o filme quanto o livro procuram reproduzir dialeto falado no sul da Escócia pelas populações menos abastadas economicamente. No filme, isso é feito verbalmente enquanto que no livro Welsh se esforça para reproduzir um dialeto oral na versão escrita. Essa característica é, então, mais um deleite para os nossos ouvidos.
Daisy Jones & The Six (2019) de Taylor Jenkins Reid
Esse é um livro simplesmente fantástico e surpreendente. Literalmente me arrancou lágrimas no final quando percebi o plot twist. Basicamente, a história narra a vida de Daisy Jones, uma cantora à la Stevie Nicks e Debbie Harry nos anos 70, e sua banda. A história é tão bem ambientada e rica em detalhes que você se sente uma estrela do rock vivendo paixões avassaladoras, experimentando a vida através de substâncias proibidas e arrastando multidões com roupas de franja e cabelos ao vento. A autora não cita músicas nesse livro, ela as escreve. Então você tem uma letra, sem melodia, o que te faz imaginar como seria a canção completa, com voz e instrumentos.
Não citei a Stevie Nicks a toa. Segundo algumas fontes, o livro foi fortemente inspirado na história real de como o álbum Rumours (1977), do Fleetwood Mac, foi composto.
Daisy Jones & The Six ganhou uma série pela Amazon Prime que estreou dia 03 de março. Inclusive, as músicas produzidas para a série foram lançadas no Spotify, assim como um vinil (deu para ouvir meus gritos daí????).
Essa playlist foi criada por mim e uma amiga enquanto liamos o livro, bem antes da série sair, portanto antes das músicas oficiais serem gravadas. Essa seleção contém as canções que imaginamos ser a vibe da história.
Alta Fidelidade (1995) de Nick Hornby
A história gira em torno de Rob, o orgulhoso, ou nem tanto, dono da loja de discos Championship Vinyl. Como não poderia ser diferente, esse livro cita muitaaaas músicas e fala o tempo todo sobre esse universo. Enquanto Rob atravessa o fim de um conturbado relacionamento, admite seus erros e investe em novos romances, a vitrola não para de rodar. Uma das coisas que eu mais gosto sobre ele é a sua capacidade de pensar as coisas mais estúpidas e atrapalhadas que uma pessoa ansiosa e insegura, atravessando um término, pode pensar. A confusão mental desse momento é simplesmente fantástica. E desesperadora.
Rob tem alguns costumes bem peculiares, como elencar seu top 5 de absolutamente qualquer coisa e claro, o título dessa edição é em sua homenagem. Ele também grava fitas K7 com músicas específicas para cada situação enquanto eu e você criamos playlists no Spotify.
Em 2020 a história ganhou uma série, de nome homônimo, em que a Zoë Kravitz interpreta a Rob. Vale muito a pena assistir. O escopo é o mesmo, dona-de-loja-de-vinil-atravessando-um-término-tendo-a-música-como-personagem-principal, diversas adaptações interessantes são feitas no roteiro como a mudança de gênero da personagem principal.
O filme tem um final açucarado e divertido em que os corações partidos são remendados com superbonder. A série, por outro lado, é amarga e pessimista e o que foi danificado permanece quebrado, como um disco arranhado. Algumas falas são reproduzidas no filme exatamente como no livro, característica transportada para a série depois.
Detalhe: Lisa Bonet, a mãe da Zoey Kravitz, interpreta a cantora Marie De Salle no filme dos anos 2000, então acho que a escolha dela para interpretar a nova Rob não foi tão aleatória assim.
Nessa playlist, você encontra todas, ou quase todas, as músicas citadas no livro.
My take on me (2016) de Morten Harket
Eu sei que vocês estão absolutamente cansados de me ouvir falar sobre o a-ha, mas esse amor é mais forte do que eu. No livro My take on me, Morten conta desde sua juventude na gelada Noruega, suas primeiras investidas na Inglaterra como músico, o sucesso do a-ha, até o hiato da banda final dos anos 90.
A leitura é fluida, leve e deliciosa. É claro que muitas músicas e bandas são citadas no livro como influência particular do Morten ou do a-ha e são essas que você encontrará na playlist Liparis Harketti. Esse nome complicado é nada mais nada menos do que o nome científico de uma espécie de orquídea batizada em homenagem a Morten, que é um aficionado por esse tipo de planta.
Só Garotos (2010) da Patti Smith
Há tempos eu queria ler esse livro, mas sempre ficava enrolando, até ganhar de presente no amigo secreto da Querido Clássico (aliás, mais umas quatro meninas ganharam esse mesmo livro haha). Patti conta a sua história com o fotógrafo Robert Mapplethorpe, com quem teve uma relação de amizade e amor muito forte e comovente. A autora fala de coisas muito delicadas e sensíveis, como a pobreza que ela e Robert enfrentaram durante a juventude, sexualidade e a entrega de um filho para adoção. Com certeza, Patti merece a reputação de grande escritora e poetisa que tem. Essa foi uma feliz oportunidade de conhecer mais sobre sua vida e a de Robert, de quem eu nunca tinha ouvido falar até então. Terminei o livro aos pedaços e estou até agora catando os caquinhos.
When the crowd goes down é um trecho da música Lullaby (I Was Working Real Hard) composta por Patti. No livro, Patti conta que cantou essa música pessoalmente para Janis Joplin, no Chelsea Hotel, após uma festa.
Bônus: Rinha de Galos (2021) de María Fernanda Ampuero
Esse livro de contos da escritora equatoriana Maria F. A. é um soco no estômago em todos os sentidos. As histórias são fortes, pesadas, impactantes e tratam da violência, especialmente contra a mulher, de diversas formas.
O conto Nam me chamou muito atenção, não apenas por citar muitas músicas, mas também pela temática. A autora fala sobre uma história de amor nada convencional que se desenvolve em meio a um cenário caótico como o alento de corações em necessidade.
É isso por hoje, tchau.
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eu sou apaixonada por Só Garotos da Patti, mas confesso que nao gostei de Daisy Jones (porém quero ver a série e AINDA não ouvi as músicas... só fiquei no livro mesmo rs).
Adorei as indicações!