O escolhido da vez foi 🥁 rufem os tambores 🥁 Voices Carry (1985) da 'Til Tuesday.
Uma coisa que eu amava na MTV e na rádio da minha cidade, quando ainda tocava gêneros além do sertanejo universitário, era descobrir músicas novas. Foi assim que eu conheci muitos músicos que admiro hoje em dia. Lembro perfeitamente do dia que eu vi o clipe de I’m on Fire, do Bruce Springsteen, pela primeira vez na MTV… those were the days!
Desse mesmo jeito descobri a ‘Til Tuesday, só que a aleatoriedade foi no Youtube. Coloquei uma seleção qualquer de músicas do anos 80 que o algoritmo me recomendou e de repente começou a tocar Voices Carry. Eu nunca tinha ouvido essa canção, nem sabia da existência da banda, mas a paixão foi imediata. Quando parei para prestar atenção na letra e no videoclipe, meuzamigos… Ok, mas vamos por partes, já já chegamos aqui.
A banda de new wave ‘Til Tuesday, fundada em 1982, era composta pela baixista e vocalista Aimee Mann, o guitarrista Robert Holmes, o tecladista Joey Pesce e o baterista Michael Hausmann. Em 1983, a banda venceu o concurso de música WBCN Rock & Roll Rumble, em Boston, resultando em um contrato com a Epic Records. Quando vi uma foto da Aimee Mann, tive a impressão de que a conhecia de algum lugar, mas achei que estava apenas associando o estilo dela com a Marie Fredriksson, do Roxette. Para minha surpresa, a menina loira no clipe de Time Stand Still, do Rush, é ela, ou seja, já tínhamos sido apresentadas.
Voices Carry, o álbum de estreia, foi lançado em 1985. Com 11 faixas no total, as canções Looking Over My Shoulder e Love in a Vacuum eram as apostas da gravadora de lançamento como singles. A estratégia foi bem sucedida, mas a música que realmente emplacou e é lembrada como o maior sucesso da ‘Til Tuesday foi a faixa que carrega o mesmo nome do álbum, Voices Carry. A canção, composta pela vocalista Aimee Mann, só foi aceita pela gravadora e pelos demais executivos envolvidos na produção da banda e lançamento do álbum diante de uma sutil, mas representativa, mudança.
Mann escreveu a música utilizando pronomes femininos de maneira que, aparentemente, a letra se dirigia a uma mulher. Temendo que isso sugerisse uma relação homossexual, a gravadora exigiu que os pronomes "she" fossem trocados por "he" na letra de Voices Carry. Assim, a gravadora preferiu ferir a liberdade criativa da compositora do que correr o risco de ter as vendas afetadas devido ao estigma e preconceito que a comunidade LGBT+ sofria na época.
A letra de Voices Carry é bem impactante. Mann canta sobre um relacionamento abusivo em que um dos envolvidos tenta moldar o outro segundo suas convicções. Além disso, a parte abusada também é sempre levada a crer que está errada e por isso, deve aceitar o que o outro deseja.
I try so hard not to get upset
Because I know all the trouble I'll get
Oh, he tells me tears are something to hide
And something to fear-eh-eh
And I try so hard to keep it inside
So no one can hear
O clipe é sensacional, e angustiante, ao transmitir as sensações da canção. O abusador, interpretado pelo ator Cully Holland, é sempre sútil ao “sugerir” que a namorada, interpretada por Mann, use o brinco que ele acha bonito e elegante, ou ao notar a trança que não gosta no cabelo dela. Vemos esses “detalhes” escalando até o momento em que uma agressão física e sexual (que é apenas sugerida no clipe) acontece. Me lembrou muito a cinebiografia da Tina Turner que o relacionamento da rainha do rock em roll e de seu ex-marido abusador, Ike Turner, é desenhado dessa forma. O clipe fez muito sucesso e ganhou o MTV Video Music Award: Melhor Novo Artista.
Depois de Voices Carry, a banda lançou mais dois álbuns antes de seu fim definitivo: Welcome Home em 1986 e Everything's Different Now em 1988. Em entrevista ao The Guardian, em 2021, Mann disse que a gravadora exigia que eles entregassem hit atrás de hit, independente de qualquer coisa. Em suas palavras:
A atitude em relação aos artistas era como se fossem cavalos em um estábulo prontos para serem atrelados a uma caroça. Se um deles morresse trabalhando, era só colocar outro no lugar. Eles não se importam. Me lembro de conversar com alguém na Geffen que estava muito chocado com o fato de Kurt Cobain ter se matado. Por um minuto eles pensaram que deveriam se importar mais com a saúde mental dos artistas. Entrevista de Aimee Mann para o The Guardian em 2021. (tradução minha)1
É uma pena que a carreira da banda tenha sido tão curta, mas as coisas são como tem que se, né? Mann se recusou a atender todos os desejos de seus empresários e por isso foi esquecida pela mídia, mas sempre será lembrada no coração de quem curte um bom e velho new wave.
Adorei essa cover da Sky Ferreira de Voices Carry. Talvez você também goste.
Também adorei esses dois blogs falando sobre a ‘Til Tuesday. Coisa de fã.
What Went Right With… ‘Til Tuesday?
Throwback Thursday: Voices Carry by ‘Til Tuesday
Esse último mês fiquei um pouco afastada porque a vida me obrigou, mas a newsletter não vai parar, viu? Aos poucos organizo o calendário.
Nesse meio tempo, a resenhas que ninguém pediu completou um ano de vida!
Um ano que você me acompanham aqui. Muito obrigada! Sério!
Tristes notícias abalaram o mundo da música. Rita Lee, Tina Turner e Andy Rourke (baixista do The Smiths) faleceram no mês de maio. É até difícil falar qualquer coisa sobre essas grandes figuras pois suas trajetórias dispensam apresentações. Pessoalmente, Rita Lee e a Tina Turner foram musas inspiradoras. Me lembro perfeitamente do dia em que escutei a Tina pela primeira vez, em um CD que encontrei no meio da coleção do meu tio, assim como do estado de êxtase quando conheci Os Mutantes. Andy Rourke não fica atrás: o baixo do The Smiths me acompanhou em muitas madrugadas melancólicas. Estou até emocionada enquanto escrevo e recordo esses momentos… mas a vida continua.
⭐recomendações que ninguém pediu⭐
❤️ Human Touch (1992) do Bruce Springsteen.
Springsteen não é o “patrão” à toa. Não tenho nada a dizer além de: PER-FEI-TO!
❤️ Photo-Finish (1978) do Rory Gallagher
Um álbum delicioso para guitarristas quebrados e apaixonados.
❤️ Hush (2016) da Palast
Um álbum delicinha para curtir na balada.
❤️ Disintegration (1989) do The Cure
Ai, amados, esse aqui é para chorar.
❤️ Better Than Raw (1998) do Helloween
Para ouvir depois do The Cure e se animar batendo cabelo.
É isso por hoje, tchau.
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💰reclames do plimplim💰
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Texto Original
Their attitude towards artists is they have a stable of horses and they want to hitch a couple up to a wagon. And if one of them dies on the job, you just put another horse in there. They don’t care. I remember having a conversation with someone at Geffen [who was] very shocked that Kurt Cobain had killed himself. They had a minute where they were like, ‘Maybe we should consider the mental health of artists on the road because it’s very unnatural”.
Eu só fui prestar atenção na banda porque meu marido é fã dedicado da Mann. Tudo que ela faz tem lugar garantido aqui em casa, que mulher.
Tô absolutamente chocado com essa revelação de que a Aimee Mann tinha uma banda new wave nos anos 80. Pra mim até aqui ela era uma singer songwriter dos anos 90 que gravou uma versão linda da minha música favorita na trilha sonora do Magnólia. https://www.youtube.com/watch?v=wc6WbTHRq9c